Durante quarenta anos, o FBI, a polícia federal dos Estados Unidos, escarafunchou a vida do cantor Frank Sinatra, com o objetivo de verificar se ele se encaixava no perfil dos dois vilões máximos da sua lista: o comunismo e a Máfia. Como é de hábito cada vez que se abrem os quilométricos arquivos sobre a vida de personalidades americanas acumulados nos anos em que o FBI esteve sob o comando do pai de todos os arapongas, J. Edgar Hoover, a ficha de Sinatra contém um amontoado de informações inúteis e duas admissões de fracasso: não, nada comprovou que o cantor-ator tenha em algum momento sido comunista; e não, apesar dos amigos suspeitíssimos, nada de criminoso selou sua proximidade com mafiosos notórios, em cuja esfera o rapazinho de família italiana começou a florescer e entre os quais continuou a circular depois de famoso.
Das 1.300 páginas sobre Sinatra, liberadas por força da suspensão de sigilo obrigatória após a morte do investigado (em 14 de maio de 1998), só 25 não foram divulgadas, por conter informações que podem prejudicar terceiros ainda vivos. Acredita-se que delas façam parte os relatos sobre Judith Campbell Exner, a gata que Sinatra apresentou a John Kennedy e que por algum tempo manteve romances simultâneos com o presidente e com o chefão mafioso Sam Giancana. Nos outros registros fica-se sabendo, por exemplo, que em 1938, quando tinha 22 anos e ainda não era famoso, Sinatra foi preso, fotografado, fichado e solto sob fiança, em uma delegacia de Nova Jersey, por sedução: fez sexo, "sob promessa de casamento", com uma jovem "solteira e de boa reputação". Um mês depois, a acusação foi mudada para adultério a moça, descobriu-se, era casada. A queixa foi retirada e o processo, arquivado.
"Neurótico" Quem chamou a atenção do FBI para Sinatra foi um colunista social famoso na época, Walter Winchell, que, numa carta anônima de 1944, afirmou que o cantor tinha pago 40.000 dólares para se livrar do serviço militar. Era falso. A polícia investigou sua ficha médica e descobriu que ele escapou do Exército (e da frente de combate na II Guerra) por ter o tímpano perfurado e sofrer de "instabilidade mental". Sinatra, já cantor famoso e assediado por fãs histéricas, declarou "ser neurótico, ter medo de multidões e vontade de correr quando se vê cercado de pessoas". Na época, porém, o que mais interessou ao FBI foi seu apoio a campanhas que cheiravam a comunismo, como a "Cruzada americana pelo fim dos linchamentos". Tanto pegaram em seu pé que, em 1950, Sinatra mandou, por um intermediário, uma prova de patriotismo: oferecia-se a espionar os colegas artistas para o FBI. Oferta recusada.
O grosso da investigação concentra-se na propalada ligação de Sinatra com a Máfia. Constam dos arquivos fotos do cantor com mafiosos, bem como registros de viagens e festas com Sam Giancana e outros chefões. Fala-se na suspeita de envolvimento em contrabando de dinheiro e em tentativa de extorsão. "Tudo o que Sinatra faz tem o dedo de Giancana", diz um dos informantes da polícia. Mesmo assim, os agentes federais não acharam meio de acusá-lo formalmente. Na década de 80, com Hoover morto, o FBI reformulado e Sinatra havia muito consagrado como lenda em todo o planeta, o arquivo enfim foi encerrado.
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